Antiella Carrijo Ramos – Eu não sou uma boa mãe
A vida anda tão corrida que eu não tenho conseguido acompanhar as notícias. Até aquelas que viralizam, aparecendo em quase todos os portais, estão passando despercebidas. Só tomei conhecimento do vídeo da maratonista que quase perdeu a corrida, porque suas filhas invadiram a pista na reta final, depois que o debate nas redes já estava bem acalorado. Foi através de um post, da jornalista Luciana Bugni no Instagram, sobre a importância de assumir não ser boa mãe para conseguir ser uma mãe possível, que fiquei sabendo da história da mãe maratonista.
Fui pesquisar e me deparei com a gravação em que o marido “solta” as crianças e elas correm em direção à mãe que vence a corrida em primeiro lugar, após desviar das filhas para cruzar a linha de chegada. O post da Luciana também trazia uma reflexão da atriz Isis Valverde, sobre a maternidade real, muito compartilhada nos últimos dias que vale a pena conferir.
A partir destas duas histórias, a jornalista escreveu sobre a complexidade que é equilibrar todos os pratos que a maternidade nos impõe. Voltando a mãe maratonista, a primeira impressão que eu tive ao assistir as cenas da corrida, é que o marido poderia ter cumprido melhor a sua missão de cuidar das filhas e ter aguardado a esposa depois da linha de chegada, não colocando em risco o resultado da prova.
Mas, ao pesquisar sobre a história, encontrei as declarações da própria maratonista e ela diz que havia combinado com o marido, para que ele estivesse naquele lugar para que ela cruzasse a linha de chegada de mãos dadas com as filhas. No entanto, ela, que não esperava ter um bom resultado, focou na corrida ao perceber que poderia ganhar e desviou das próprias filhas para alcançar o primeiro lugar no pódio.
A situação exposta na gravação me fez acusar o marido, acreditei na tese de que ele, propositalmente, poderia ter boicotado a vitória da mulher e assim aderi ao julgamento e ao coro bastante polarizados que invadiu a vida desta família. Cheguei a pensar que a justificativa era só para reduzir os danos do cancelamento do marido nas redes sociais e foi assim que me vi no lugar de quem aponta o dedo e, apesar de todo simbolismo contido no vídeo de um homem que interrompe a meta da mãe, neste lugar eu não queria estar.
Passada a euforia imediata, li muitas opiniões e para a minha surpresa a mãe também sofreu ataques e estes chamaram a minha atenção. Muitas pessoas cobravam dela uma outra atitude, alegando que ela deveria ter se entregado ao amor e ao carinho das filhas, abrindo mão da sua vitória. Este tipo de comentário atravessou essa mãe que escreve, que também é psicóloga e educadora, e que passa a vida equilibrando pratos tentando dar conta de tudo.
No meu caso, não estou sozinha, conto com uma rede de apoio e com um companheiro que divide as tarefas e as responsabilidades, mas, ainda assim, ser mãe é muito difícil e a romantização da maternidade nos enche de culpa, principalmente, quando, em alguns momentos, resolvemos priorizar a nossa própria vida, como fez a mãe que ganhou a corrida. A maternidade real vem com muitas dificuldades, desafios e responsabilidades em cuidar de uma criança e não basta só o amor, requer trabalho e dedicação que, muitas vezes, nos obriga a esquecer dos nossos próprios sonhos, deixando sempre para depois, dos mais simples aos mais complexos, os nossos desejos e vontades.
Antes que comecem os julgamentos, afirmo que não se trata de ser egoísta, tampouco ser uma mãe cruel e desnaturada, mas se trata de diminuir a culpa quando nos desviamos dos nossos filhos, para continuar correndo em busca das realizações que enchem a nossa vida de vida, nos fazendo felizes para viver a maternidade de uma maneira mais leve. Não é fácil admitir, mas eu não sou uma boa mãe, sou a mãe possível, aquela que eu consigo ser, diante da realidade desafiadora e muitas vezes dolorida da aventura que é ser mãe.
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