Celso e Junko Sato Prado – Santa Cruz do Rio Pardo: alguns antigos hotéis e pensões
Difícil localizar e datar os antigos hotéis e pensões santa-cruzenses, sem o risco de esquecer um ou outro, talvez nome ou época errada, afinal foram diversos e deles, grande parte, sabemos apenas a partir de determinado acontecimento ou momento, não necessariamente o seu início.
Alguns destes estabelecimentos contam pedaços da história de Santa Cruz do Rio Pardo:
- Hotel Filandro: A primeira hospedaria que se tem notícia para Santa Cruz do Rio Pardo teve o nome de Hotel Filandro ou Pensão da Dona Chiquinha, Francisca Novaes Cortez, casada com João Nepomuceno Cortez. Ignora-se o motivo do nome Filandro, pressupondo algum italiano pioneiro no ramo hoteleiro santa-cruzense.
Pelas descrições de Rios (Rios – José Ricardo. ‘Coronel Tonico Lista, o perfil de uma época’, 2004: 18-19), o estabelecimento situava-se no encontro das atuais ruas Barão do Rio Branco Catarina Etsuko Umezu, com pasto ao lado e fundos, cercado até o Rio Pardo, para, além do abrigo, descanso alimentação dos bois [de carros] e animais de montarias dos hóspedes; estacionamento da época.
Neste hotel teria se hospedado Antonio Candido da Silva, seus pais e a irmã, quando chegaram de São Simão para morada em Santa Cruz. Antonio Candido mudaria seu nome para Antonio Evangelista da Silva, vulgo Coronel Tonico Lista, que, num futuro já próximo, viria fazer história de terror na comarca de Santa Cruz do Rio Pardo.
Do hotel, documentos comprovam existência ainda no século XIX, mas os Evangelista da Silva dificilmente teriam se abrigado por lá, afinal tinham familiares já moradores em Santa Cruz, não sendo costume na época deixar de hospedar-se em casa de parente; isto soaria como ofensa familiar, mas o autor José Ricardo Rios ignorou estes detalhes.
No ano de 1892 o Hotel Filandro, segundo a Câmara Municipal em resposta às autoridades estaduais, era um dos dois hotéis existentes na zona urbana santa-cruzense, sem identificar o outro estabelecimento que pertenceria ao Firmino da Silva, conhecido por Firmino Gordo, talvez aí erro camarário, pois, quase certo, o Firmino tornara-se o dono do Hotel Filandro.
- Hotel dos Viajantes: de Israel Machado, situado à rua Saldanha Marinho, homem envolvido na política santa-cruzense.
Defronte do Hotel dos Viajantes o ponto de saída e chegada dos ‘troly’ com passageiros com destino ou regressando de Cerqueira Cesar, onde a linha férrea estacionada na época.
- Hotel do Peixe: do capitão José Antonio de Moraes Peixe, instalado à Avenida Tiradentes, deixou de funcionar algum tempo após a morte de seu proprietário, assassinado a mando do coronel Antonio Evangelista da Silva, Tonico Lista, aos 20 de setembro de 1913. Peixe deixou toda a fortuna à viúva, sua herdeira única e meeira, Emerenciana Joaquina de Andrade.
Documento municipal de 02 de novembro de 1913 aponta dona Emerenciana proprietária do Hotel Peixe (A Cidade, 02/11/1913: 2), prédio onde, em 1918, se instalaria o Hotel Scazzola.
- Hotel Familiar: propriedade de Joaquim Ricardo Marques, no Largo da Liberdade esquina com a Rua Senador Euzebio de Queiroz. Em 1909 o hotel mantém os mesmos: nome, proprietário e endereço.
Uma curiosidade, o engenheiro Cornélio Schimidt em seu “Diario de uma viagem pelo Sertão de São Paulo, realizada em 1904”, às páginas 448-449, informa ter-se hospedado no Hotel Familiar, de “Pedro de Tal”, que seria o senhor Antonio Pedro de Carvalho, posteriormente, em 1919, citado efetivo dono do Hotel Familiar, com endereço informado, “Rua Antonio Prado – antiga residencia do cel João Castanho” (O Contemporaneo, 1919).
—Antônio Pedro de Carvalho teria arrendado antes o hotel, por algum período, para, somente depois, tornar-se efetivo proprietário em outro endereço.
- Hotel dos Operários: em 1910 anunciado como propriedade de Aristides da Silva Rocha, sem nenhum outro dado. Lamentamos.
- Hotel Bela Vista: em funcionamento em 1910, de Carlos Kuhne, ali foi hóspede o médico Dr. José Carqueijo (O Contemporaneo, 24/011918: 1 – provisoriamente no Hotel Bela Vista). Dr. Carqueijo é o nome dado ao Centro de Saúde local.
O advogado Dr. Pedro Sampaio Doria residia no “Hotel Bella Vista”.
- Hotel Paulista: de Francisco Pinto Ferreira, em 1910, depois adquirido por Candido Barboza ou Barbosa, no Largo do Jardim (O Contemporâneo, 1915) – atual Praça Deputado Leonidas Camarinha. Posteriormente, com mudança de razão social e denominação, em 1917, deu lugar ao Grande Hotel Maison Doré (O Contemporâneo, 1915).
Candido morreu em 1918, acometido de Gripe Espanhola.
- Grande Hotel Prado: de João Nonato Prado, à Rua Visconde – hoje Barão do Rio Branco, nº 16, telefone nº 94 (O Sul Paulista, SCRPardo, 1913).
- Hotel Scazzola: O mais conhecido e tradicional dentre os hotéis santa-cruzenses, pertenceu a Alberto Scazzola (O Contemporaneo, de 24 de setembro de 1916).
Antes do hotel ser instalado no imóvel mais tradicionalmente lembrado dos santa-cruzenses, à Avenida Tiradentes nº 313, esquina com a Conselheiro Dantas, o antecessor situava-se num prédio já demolido e outro construído no lugar para abrigar, primeiro o Mercantil e depois o Banco Itaú Unibanco, com evidentes reformas, sito à Avenida Tiradentes nº 306.
Do antigo prédio de onde se mudou em 1918, para o prédio em frente, outrora Hotel do Peixe, no início Alberto Scazzola tocou o comércio nas duas edificações, depois o menor deixado e demolido para dar lugar, em 1943, ao edifício do Banco Mercantil.
— O Banco Mercantil, depois, transferiu-se para onde funcionava o Banco Comercial, e este, com o nome Itaú, foi para o lugar de onde saíra o Mercantil. Complicado, mas, não tão difícil de entender.
O Grande Hotel Scazzola, cujo imóvel adquirido por Alberto Scazzola, foi arrendado ao comerciante Germano Villar, o Germaninho (Correio Paulistano, 23/11/1925: 14), mencionado depois, em 1927, Hotel do Germaninho (A Cidade). Em 1929 a administração do hotel passou a Rolando Falci (Correio Paulistano, 12/09/1929: 14). No período Alberto Scazzola residiu em Avaré, retornando depois para Santa Cruz, reassumindo o hotel.
O Hotel Scazzola foi objeto de ação hipotecária, movida por Leonidas Camarinha contra Alberto Scazzola e sua mulher, e de uma segunda hipoteca a favor de Carlos e Américo Orsollini (Diário Oficial do Estado de São Paulo, 13/01/1938: 33), com pregão de arrematação aos 07 de fevereiro de 1938.
Sabe-se que o Hotel Scazzola, após essa pendenga judicial, continuou funcionando no mesmo local, sob a direção de dona Yolanda Menha, esposa de Fioravante Menha, sogros do saudoso médico Dr. Aparecido Rodrigues Mouco.
- Grande Hotel Maison Doré: de Barbareso & Catani, em 1917, advindo do antigo Hotel Paulista, à Praça da República nº 7, atual Deputado Leonidas Camarinha.
- Hotel Itália ou da Viviani: situado na Travessa Manuel Herculano, onde, em frente, o policial Marianno Pimentel, de Espírito Santo do Turvo, foi morto pelo comerciante Antonio Lucindo Ramalho, tenente policial, aparentemente por discussão fútil. Marianno fora receber soldo seu e dos companheiros, numa agência bancária defronte ao Hotel Itália. O crime, versão santa-cruzense, teria sido político e em represália ao atentado que Tonico Lista determinara contra o capitão Theodorico Franco.
O Combate, folha paulistana, noticiou o acontecimento:
“No dia 2 de janeiro, foi assassinado em Sta. Cruz do Rio Pardo, pelo tenente Antonio Lucindo Ramalho, o aspessada Marianno Pimente.
Este soldado estava em frente ao Hotel Viviani, em companhia de várias pessôas, quando passou o tenente Lucindo que, vendo-o lhe fez um gesto indecoroso.
O anspessada Pimentel, diante desse insulto, que lhe era feito em presença de seus amigos, reagiu incontinente, dizendo-lhe que repetisse.
O tenente Antonio Lucindo immediatamente sacou de um revolver e desfechou-lhe á queima roupa cinco tiros, acertando dois na cabeça e tres no peito produzindo-lhe morte immediata.
O anspessada Pimentel que serviu a policia durante dezesete annos, deixa na maior das miserias a viuva e um filhinho doentio.” (O Combate, 12 de janeiro de 1918: 1).
O dito hotel era diviso com os fundos da residência do médico Dr. Pedro Cesar Sampaio, ficando em frente ao banco e depois centro telefônico.
- Pensão Brasil: incerta sua fundação, mas, ativa nos anos 1918/1919, durante a Gripe Espanhola em Santa Cruz do Rio Pardo:
“Na Pensão Brasil reunio-se ante-hontem a Cruz Vermelha desta cidade para discutir e resolver assumptos de interesses sociaes.
Além de diversas resoluções de ordem administrativa, foi nomeada uma commissão para entender-se com a directoria da Misericordia Santa Cruz e com ella combinar o trabalho que a associação possa ainda prestar aos grippados pobres, internando-os naquella casa de caridade, e isto em virtude de ter sido fechado o hospital installado no Grupo” (O Contemporaneo, 19/12/1918: 2).
- Grande Hotel Central: teve como primeiro proprietário o Candido Barbosa, falecido em 1918, acometido de Gripe Espanhola, e, pouco depois o hotel deixava de funcionar. Foto de 1925 mostra terreno vazio e murado.
No ano de 1949, pretendendo prédio próprio para a Agência dos Correios, o prefeito Lucio Casanova Neto, pelo decreto nº 21, de 15 de julho, desapropriou o terreno do hotel demolido, da família Barbosa (Adelaide, Cândido, Noêmia Carmem e Hercília e/ou sucessores), nas medidas de 25 metros de frente por 35 de fundos, na esquina da atual rua Farmacêutico Alziro de Souza Santos – defronte à praça Deputado Leônidas Camarinha, com a rua ‘Coronel Julio Marcondes Salgado’, parte da rua Joaquim Manoel de Andrade, conforme mencionado expediente. O Correio ainda funciona no lugar.
- Hotel Central: no ano de 1924, em funcionamento e sob a administração da família Besana, situado pouco antes onde outrora o Grande Hotel Central. Para melhor situar-se, onde a casa do saudoso Antonio Francisco Zanete, o ‘Batatão’.
No ano de 1924 o líder revolucionário João Cabanas chegou a Santa Cruz, hospedando-se por poucas horas no Hotel Central, e ali fez prender o promotor público Dr. Viriato Carneiro Lopes, o delegado de polícia Dr. Athos Ribeiro e o prefeito municipal Dr. Pedro Cesar Sampaio, por armação de atentado contra o líder no retorno de Santa Cruz, que os três confessaram cientes, indicando caminho alternativo, afinal conduzidos presos no mesmo veículo que Cabanas e juntos sofreriam a emboscada que poderia ser fatal.
No ano de 1927 o hotel Central era propriedade das Irmãs Gonçalves (A Cidade, 1927), figurando proprietário seguinte o Rolando Falci que mudou o nome do estabelecimento para Hotel Rolando.
- Hotel Familiar: No ano de 1924 a família ‘Yoshisaki’ é proprietária do Hotel Familiar, em Santa Cruz do Rio Pardo, situado à Rua Marechal Bittencourt (A Cidade, 18/04/1924: 6).
Pouco depois, Ogata Kiota é o proprietário do hotel e do armazém de secos e molhados, contíguo ao hotel, conforme comunicado à Municipalidade:
“(…), não continuando neste exercício com o seu negócio de seccos e molhados e hotel de 2ª classe, vem respeitosamente ante V.Exa., requerer a competente baixa, não tendo feito em termo oporttuno por desconhecer a lei Municipal que rege a materia pelo que confiado nos supplementos de V.Exa. pede ser attendido” (Prefeitura SCR. Pardo, Livro de Registros – Requerimentos, exercício de 1925).
José Cardinali, em 1927, figura dono do Hotel Familiar, à rua Marechal Bittencourt, colocado à venda (A Cidade de 20/03/1927).
- Santa Cruz Hotel: de Domingos Serafino, com anexo para restaurante e bar (A Cidade, 27 de abril de 1927 – gentileza Edilson Arcoleze)
- Palace Hotel: em prédio reformado para adequar-se ao ramo hoteleiro, inaugurado aos 09 de maio de 1928, propriedade de Oscar Buscacio, à rua Saldanha Marinho (A Cidade de 06/05/1928). Nesse hotel, se hospedou o ainda major Leônidas do Amaral Vieira, por ocasião da Revolução de 1930:
“DIA 12 DE OUTUBRO.
-O Batalhão ‘Ataliba Leonel’ aqui concentrado, prestou homenagens às autoridades locaes. Reunidos os bravos soldados do Batalhão, tendo à frente a banda de corneteiros e tambores, dirigiram – primeiramente ao Palace Hotel, às 20 horas, onde se acha o deputado Leonidas Vieira, digno e estimado Comandante do Batalhão. (…).” (A Cidade, 19/10/1930: 1)
- Hotel Rolando: este estabelecimento foi anunciado em 1932, propriedade de Rolando Falci, hoteleiro já conhecido quando à frente do Hotel Scazzola.
- Hotel Pinheiro: situado em frente a Agência Chevrolet (Jornal O Jornal 1928), sem informações sobre o proprietário. Por informações, ainda sem acessos aos documentos, o Hotel Pinheiro, após imponente reforma, deu lugar ao Grande Hotel Santa Cruz, dos Irmãos Saliba e Cia.
- Hotel Tayo: Documento de 1935 revela instalado em Santa Cruz do Rio Pardo o Hotel Tayô, da família Kuwabara, à rua Marechal Bittencourt, com inscrições em caracteres katakana e kandi.
- Pensão …
Ops, espaço findo, que pena, quem sabe voltaremos ao assunto, com as inesquecíveis pensões santa-cruzenses: a “Pensão da Edna”, a Pousada dos Viajante, a Pensão ou Hotel Nossa Senhora da Aparecida, a Pensão São Paulo e depois São João, a Pensão Santa Terezinha etc., quem sabe outras; valeu Edilson Arcoleze pelas dicas.
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